quinta-feira, 28 de abril de 2011

Conexão

Conexão

Era uma manhã fria do mês de abril, ela acordava cedo para trabalhar, tomou banho, arrumou-se, tomou o café da manhã, ao sair na rua sentia-se triste, no mundo havia concreto demais. Pensava. Sentia falta das arvores, dos pássaros, do cheiro de terra e do barulho do vento...
O tempo havia passado e naquela cidade, outrora tão bela nada do ilustre verde havia restado. Ela caminhava pelo parque, umas poucas árvores haviam ali, nada que merecesse importância ou um olhar deslumbrado, o progresso tinha dessas coisas, transformava, mas nem sempre o que era para ser bom o era realmente, sua cidade era tão bela, tão verde e viva, pulsava como um coração bombeando vivacidade e esperança... Como sentia falta.
Naquele dia frio de outono, ela estava particularmente triste, não que alguém pudesse notar, mas estava, e no seu íntimo algo se encolhia, era uma miniatura de si, aquela que ninguém haveria de conhecer, seu eu sonhador. Não era feia nem tão bela, era apenas uma mulher, que linda ficava quando sorria, sublime quando chorava e seduzia quando queria, bastava um olhar fugaz e ela era capaz, mas para ela isso não era suficiente, sentia-se vazia, perdida, havia tantos pensamentos e inquietações que queria compartilhar com alguém, mas não havia ninguém especial, ninguém que conseguisse conquistar seu coração, e havia ali tanto amor para dar.
Ela entrou no escritório, cumprimentou a todos, sentou em sua mesa, ligou o computador, e pôs-se a trabalhar, tal qual um robô, aquilo tudo era tão automático. Foi almoçar com uma "amiga", alguém incapaz de compreendê-la ou aceita-la. Mas para ela era conveniente que a tivesse, pois isso não a tornava, pelo menos não diante da massa, uma esclusa social. Ela não era arrogante, ou sentia-se de alguma forma superior, ela apenas era complexa demais para a sociedade em que vivia. Ela comeu o prato especial do dia, ouviu as fofocas mais quentes sobre os colegas de trabalho, nada interessante, não para ela, tomou o habitual cafezinho a tarde com os colegas de trabalho, outro meio de se socializar, encerrou o expediente e foi para casa.
Tomou banho, comeu seu miojo de cada dia enquanto assistia a novela, terminou seu jantar, lavou os pratos, deitou-se na cama, pensava que em algum lugar do mundo alguém desejava conhecer uma pessoa como ela, adormeceu, acordou no meio da madrugada, sentia-se cansada, mas não com sono, foi assistir tv,  um filme idiota passava na tv, não lhe prendeu a atenção, resolveu escultar música... Em meio aos doces acordes que formava tal intensa melodia ela pensou:
"Haveria alguém no mundo, que fizesse o mesmo que eu? Que sonhasse o mesmo que eu e que estivesse pensado algo parecido agora, neste momento?!"
Ela levantou-se do sofá onde esteve sentada, foi a cozinha, pegou uma cerveja na geladeira, abriu, sentou-se novamente no sofá e pôs-se a beber, olhava fixo para um ponto próximo a porta do quarto, havia ali um rapaz, ou um vislumbre de um, que olhava para ela com a mesma perplexidade... Ela piscou, ele sumiu.
Ela acordou no horário de sempre, arrumou-se, preparou o café da manhã, comeu e foi ao trabalho, seguiu sua rotina de sempre... trabalho, almoço com amiga, trabalho, cafezinho com o pessoal do escritório, encerrar o expediente e voltar para casa.
Na volta para casa a velha saudade bateu, saudade das numerosas árvores que coloriam a cidade com suas diversas tonalidades de verde, saudade do barulho do vento, do cheiro de terra e do cantarolar dos inúmeros pássaros... ela parou no meio da rua distraída, olhava para o céu, as lágrimas vinheram não sabe-se de onde, inundaram seus olhos e molharam seu rosto borrando a simples maquiagem, ela limpou as lágrimas com as costas das mãos e quando olhou para frente ela o viu, novamente como um vislumbre, o mesmo rapaz da noite anterior, mas ela estava sóbria, e havia uma estranha conexão entre eles... Um casal passou a sua frente e o rapaz desapareceu naquele instante de distração.
Ela voltou para casa sentindo-se um pouco louca, achava que estava sob muito estresse, tomou um banho, preparou um sanduíche e leite, pegou um livro da sua estante, sentou-se no sofá e distraiu-se na leitura. Então uma melodia familiar tomou conta do ambiente ao seu redor e tudo mudou, sua sala não parecia a mesma, e havia alguém mais nela, na outra poltrona olhando-a com uma imensa curiosidade e familiaridade, o rapaz. ela levantou do sofá e tudo voltou ao normal.
Dias se passaram seguindo a mesma rotina de casa e trabalho, e por várias vezes nesses dias o rapaz de sua visão continuou a aparecer... sempre um vislumbre. Temia estar ficando louca, não ousava contar a ninguém. Será que era um fantasma?! Melhor não falar nada para ninguém. Enfim chegava o fim de semana e ela iria por a casa em ordem, manteve-se ocupada e não o viu. Dias se passaram e não o viu mais.
Certa vez resolveu aceitar um convite para um jantar com um colega de trabalho, eles já haviam saido algumas vezes e sempre era divertido, até que uma noite ela o convidou para sua casa, eles tiveram relações, mas não foi doce e quente, e nada daquilo a fez sentir viva, apenas lhe fez repensar tudo o que estava acontecendo, será que deveria continuar com aquela relação?! De certa forma era cômodo voltar para casa acompanhada, também era bom estar com alguém ainda que esse alguém não a entendesse. Mas ao mesmo tempo que tudo parecia bem, ela sentia um vazio crescendo dentro de si, como se tivesse sede e nada a saciasse. Então ela o viu, encostado na parede ao lado da janela, olhando para ela distraído...
O ronco do seu parceiro na cama, fez com que a visão do rapaz se desfizesse. E por muitos anos ela não o viu...
Um dia, numa manhã de abril quando ela voltava do escritório de seu advogado com os papéis do divórcio, havia passado cinco anos casada, ela repensava sua vida, estava mais madura, teve sua experiência com o casamento, não desejava a maternidade, não ainda, resolveu que ia em busca de um sonho, pois havia se entregado ao óbvio, ao que se espera que façam todas as mulheres, mas ela, diferente de tantas não conseguiria sustentar ainda mais um casamento sem que houvesse a miníma compatibilidade... Voltando para seu apartamento, agora só, ela colocou sua música favorita, abriu uma garrafa de vinho, sentou no sofá e lá ficou, refletindo sobre suas escolhas, ela lembrou do rapaz que via sempre. Pensou no que aquilo significava, adormeceu.
Acordou com o som da campainha, era sua amiga, que vinha conversar amenidades, já estava quase na hora do almoço, ela tomou banho e arrumou-se, resolveram almoçar juntas, relembrou os velhos tempos, a vida parecia força-la a voltar ao mesmo lugar de sempre. Elas passaram a tarde no shopping em meio a compras e fofocas. Não havia sentido naquilo por mais que ela tentasse encontrar. Se despediram, ela seguiu para casa.
O cheiro de seu apartamento era o mesmo de sempre, mas não lhe agradava, ela ansiava por mudança. Tomou uma decisão, fez as malas, arrumou os documentos na bolsa e dirigiu-se ainda na mesma noite ao aeroporto da capital, era uma mulher livre de trinta e poucos anos, divorciada, com uma vida cheia de possibilidades pela frente... Chegou ao aeroporto, decidiu seu destino no uni duni tê, pegou o vôo e foi em busca de um novo caminho, não havia medo, ela sabia que ir em busca do desconhecido e satisfazer a si era seu destino, e ela foi lutar bravamente em direção ao acaso...
Quando o avião aterrisou e ela desceu, sentiu-se renovada, como se tivesse transformado em uma outra pessoa, sentiu que o mundo era maior. Ela saiu pelo o portão de embarque dois, e lá vindo de outro vôo ela viu, não sabia seu nome, sua idade, mas sentia que já o vira antes, e ele a notou, e se aproximou.
- Nós já nos vimos antes?!
Ela sentia que já o conhecia, havia uma estranha conexão com aquele estranho, forte demais para passar despercebida.
- Sinto o mesmo.
 Isto foi o que ela disse sorrindo. O destino os havia conectado, e ela tinha certeza ...

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